Existe um quociente que define o quanto eu gostei ou não do disco que estou ouvindo. Ele consiste em quantas vezes ouvi inteiro sem parar, quantas vezes voltei frases marcantes e, principalmente, quantas vezes eu indiquei para amigos que provavelmente tenham interesse. Neste último parâmetro, entram variáveis do tipo quantas pessoas realmente ouvem rap e eu indiquei, quão universal é o disco, musicalmente falando, dentre outras.

Deixando um pouco de lado esse quociente inventado na minha cabeça e que não deve lá fazer muito sentido, o disco novo do Kamau, Licenças Poéticas (Experimentos Pessoais) conversa muito com o ouvinte, faz e incita reflexões. Parece uma daquelas conversas que você não quer que acabem, você encontra a pessoa no mesmo ponto de ônibus e começam a desvendar o maior mistério da vida e aí chega o ônibus e a pessoa parte, você conhece a sensação.

Muitas vezes a melhor hora para deixar uma resenha de um disco pronta é assim que ele passa a me dizer algo além da estética do beat, ou da qualidade das rimas. É como se ela passasse a realmente dizer o que sente quando você bota pra tocar. O disco novo do Kamau meio que transparece tudo isso, meio que respira, que entra de sapatinho em nosso cotidiano e se encaixa como numa conversa de amigos.

“melhor me manter no meu elemento / fazer da música o ar e meu alimento”

A anotação que fiz da primeira vez que ouvi o álbum foi apenas “Kamau novo: plmdds!!!”, o que significa que gostei muito, caso não tenha ficado claro. Toda essa vibe smooth do começo do disco te introduz em climas e cadências e cores e inspirações profundas com frases marcantes. Grandes discos, afinal, são feitos de frases emblemáticas. E no trecho “se acharam que eu seria um pensamento vagabundo, eu era um verso pronto pra ganhar o mundo” de “Verso em verso”, a segunda do disco, eu já estava quase anotando pra tatuar em algum momento da vida.

Neste disco e talvez em toda a sua carreira, Kamau trabalhou ou transparece uma parada mais tranquila. É como se ele fizesse parte de um estilo de rap não emocionado, mais pé no chão, campinho de terra como se o mundo pudesse tranquilamente acabar a qualquer momento sob a trilha sonora de G&E e Blu cantando “Old Souls”, citada na música “Fuso” (Hora Extra), uma referência que achei no Genius né gente, vamos usar a internet a nosso favor etc acabamos descobrindo com a audição frequente.

“Na linha incompleta não cabe muleta”

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O disco abre num “Com licença” como uma introdução bonita como um resumo da linha poética que vem pela frente. Um dos grandes pontos é a lírica de pensamentos construídos sobre a criação e composição musical, sobre a inspiração (visite-me) ou sobre a frustração (evite-me). Kamau escreve sobre os percalços de seu próprio trabalho e faz o ouvinte refletir sobre a vida caminhando sobre beats muito significativos e repletos de alma, de construção musical, de energia. É um disco cheio que soma com o dia a dia, inspira, dá motivação, faz viajar.

A poesia de Kamau se confunde com beats mais elegantes e acho que não precisava dizer isso, vem cá, o bagulho é rapBR finests, dá licençaqui. Tem a vibe de uma letra escrita no guardanapo na saída de alguma casa de show, até a nostalgia de quem já está a milianos na cena. Kamau é tendência, é prata da casa onde quer que toque. Inclusive, julgo quem não pensa assim. Julgo tanto quanto quem vaia o KL Jay, a propósito (a polêmica gratuita é um oferecimento Per Raps).

O disco está disponível em www.planoaudio.net. Ouça agora!

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