Todo dia 13 de março é uma data de celebração no rap nacional. É quase um feriado nacional. Nesta data, o ponteiro do relógio marcando 18h ganha outro significado e o anseio por bater o ponto do trabalho é substituído pela curiosidade de colocar o fone de ouvi. Em quatro anos de carreira solo, o rapper mineiro Djonga se tornou o principal ícone dessa nova geração e, após marcar hat-trick com Ladrão em 2019, Histórias da Minha Área é seu poker – o quarto gol da carreira.

A cantora Bia Nogueira é quem abre o disco, na primeira faixa O Cara de Óculos, tendo papel fundamental para narrar o rolê de Djonga pela sua área. Ali, como se fosse a mãe de Gustavo, Bia dá um recado ao filho, antes de sair de casa. O pedido de cuidado na rua vem através da frase “nem é cedo demais pra saber que a vida é desgraçada aqui”, para lembrar que muitos jovens da periferia saem, mas nunca mais voltam.

Depois de se impor na cena em Ladrão, Djonga mostrou seu lado mais frágil – e fez com maestria. Para narrar um pedaço de sua história, é preciso se abrir e saber expressar todos os sentimentos e sensações de maneira transparente. Ao longo do disco, o rapper é irônico, provocador, conflitante, impositivo e também triste – muitas vezes tudo isso ao mesmo tempo. É um Djonga que alcançou sua liberdade para mostrar quem foi o Gustavo antes do disco Heresia (2017). 

Histórias da Minha Área mistura a celebração com a saudade. Ao andar pelas ruas e vielas da sua quebrada, divide a felicidade de dividir suas conquistas com seu povo, mas lamenta a ausência daqueles que não estão ali para compartilhar o momento. A faixa “Não Sei Rezar” é a celebração da vida dos nossos, que acordam todas as manhãs para buscar a vitória, mesmo sabendo que tudo pode terminar em um segundo – e sem motivo algum. Dinheiro e poder é bom, mas cuidar de sua família e da sua área é o principal.

Para Djonga, antes de ser um marco na história é preciso ser história na sua área. “Oto Patamá” sintetiza sua vitória espiritual, porém lembra que é preciso voltar e inspirar as crianças negras e periféricas da zona leste de Belo Horizonte. Ali, fazer história é conseguir contribuir com encorajamento e esperança.

Os áudios quem surgem ao fim das faixas sustentam que Gustavo é o cara da sua área. Sua presença no palco e representatividade inspira os seus, que mandam mensagens de agradecimentos, sendo todas “de coração”, como eles mesmos falam. 

O álbum é um Djonga de guarda baixa. Ao longo das faixas, ele narra a saudade de casa, da família, sua relação com Jorge, o racismo estrutural, o preço da liberdade e, como um homem em desconstrução, também se desculpa. Talvez, por essa sensibilidade apresentada, o rapper apostou nas melodias, cantando mais do que em qualquer outro álbum.

Além disso, o mineiro novamente apresenta novas talentos à cena. Em Heresia, apresentou Yodabren. No álbum seguinte, Sidoka foi a grande revelação e roubou a cena. Já em 2019, o espaço foi aberto para MC Kaio e Doug Now. A tradição foi mantida no novo disco. Agora, é a vez da rapper Cristal e do trapper carioca NGC Borges. Recém estreantes na cena, jogaram como atletas maduro. Foram para o campo cheios de confiança, esbanjaram talento e qualidade. Mais uma demonstração de que a base vem forte.

Histórias da Minha Área, apesar de ser o quarto álbum de estúdio, é a introdução de toda a vida de Gustavo. A obra apresenta o valor verdadeiro por traz da coroa conquistada por ele, mostrando que sua carreira só será sólida se trouxer com ele sua base, seu ponto de partida. Mostrou ser possível ser o melhor da cena, enquanto também é o melhor de sua comunidade. A cada ano, o rapper mineiro demonstra evolução e maior amadurecimento, deixando uma certeza de que todo dia 13 de março, podemos levantar a plaquinha: “Hoje tem gol do Djonga”.

Ouça o álbum em:

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