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– por Eduardo Ribas

Ao
mesmo tempo em que um enquadro pode servir como um reparo, pode
servir também como uma punição, um castigo que serve para colocar
algo de volta ao que em algum momento é considerado o certo, o
ajustado. A vida, dura como ela é, e que nos apresenta obstáculos
que nos enfraquecem um pouco mais a cada dia, ainda nos traz
diariamente esses enquadros em cada esquina, em cada ônibus lotado,
em cada vez que você precisa se justificar para o seu chefe ou ao
seu próprio pai e em cada relação que você vê que está em
desvantagem em termos de poder apesar por ser quem é.

Falta
voz, a sensação é de sufoco, e quando você percebe que nada vai
ficar mais fácil com o passar do tempo, muito pelo contrário, o
desespero bate. É nesse momento em que você decide encarar e junta
todas as suas forças para seguir em frente, ou então desistir.

Se
você for preto ou pobre, então, sua desvantagem é ainda maior,
como se você fosse um corredor iniciante e ao lado só visse clones
de Usain Bolt competindo com você na grande corrida da vida. Sem
contar os obstáculos complexos e mortais que encontramos pelo
caminho. Ninguém disse que essa corrida seria fácil, mas também
não precisava ser assim tão difícil.

Assistir
ao clipe de “A Cena” traz um pouco desse sofrimento diário que
passamos, e cai como uma luva nesse mês da Consciência Negra,
momento em que a sociedade para e pensa  (ou ao menos deveria)
sobre a causa negra. Que causa negra? A que enfrenta o racismo que
aparece no anúncio de vaga para a nova série do Netflix ou quando a
atriz negra da novela (Taís Araújo) é hostilizada nas redes
sociais, no negro estereotipado na propaganda ou em quadros de humor
na TV, no momento em que alguém defende que chamar o outro de macaco
é só brincadeira ou que a mulher negra é associada apenas ao
prazer e ao sexo e até mesmo quando um simples conselho, dado sem
maldade para uma criança de 5 anos, diz respeito a alisar o cabelo
“ruim”.

Com
direção de Levi Vatavuk, que já trabalhou com Rashid em “Patrão”
e com o grupo Inquérito, o clipe de “A Cena” conta com a
participação da cantora Izzy Gordon e do DJ Mr. Brown e foge do
enquadro “tradicional” mostrado em rima, aquele feito pela
polícia, e dá luz à todos os sufocos que passamos no dia a dia,
sem chances de gritar e mostrar que temos uma voz. “Em que momento
você se sente enquadrado? Em que momento você também não está
“enquadrando” alguém sem perceber?”, questiona Rashid.
Essa é fácil de responder: enquanto vivermos em uma sociedade em
que as relações de poder entre homens (e mulheres) existirem a cada
interação, seja na conversa ou mesmo um olhar, e uma das vozes se
achar no direito de se impor a outra, os enquadros vão continuar
existindo. Afinal, basta estar vivo para enquadrar ou ser enquadrado.

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