A representatividade importa. E felizmente essa questão tem se tornado essencial na escolha de protagonistas nos mais variados setores da sociedade, inclusive no entretenimento. Sabemos que ainda é quase nada, mas já é um começo. Pude conferir isso de perto no João Rock, em Ribeirão Preto.
Ao completar 18 edições, o maior festival do interior do Brasil [que esgotou todos os 65 mil ingressos colocados à venda] escalou para o seu line-up uma quantidade considerável de rappers, em sua maioria pretos. Emicida e Rael, que convidaram o Mano Brown, foram os principais headliners de um evento dedicado ao rock. Na ocasião também participaram bandas icônicas, como Capital Inicial, CPM 22 Raimundos e Paralamas do Sucesso. No entanto, os holofotes se voltaram para os principais difusores do RAP no Brasil atual: Djonga, Rincon Sapiência, Marcelo D2, BK, Filipe Ret.
[É bom ressaltar que nos comerciais de TV, transmitidos pelas afiliadas da rede globo no interior de São Paulo, nenhum dos artistas de RAP foram citados, exceto o D2.]
Sem fazer uma análise precisa poderíamos concluir que essa decisão foi tomada por que agora o RAP é um dos gêneros mais consumidos e os artistas fazem parte do hype. Assim, carregam multidões por onde vão. Mas não. Conversando rapidamente com algumas pessoas que estavam na primeira fila do palco Fortalecendo a Cena [o que mais recebeu shows de RAP] pude perceber o quão a representatividade é essencial [inclusive no RAP, que nos últimos anos esteve permeado de artistas brancos de classe média falando sobre curtição, maconha, dinheiro e mulheres]. Alguns ali só decidiram ir ao JR após saber que Djonga, BK, Emicida e Brown participariam. Nada mais.
A juventude preta, de quebrada, se viu REPRESENTADA num rolê voltado a um estilo que nem é o que elas curtem no dia a dia. Diversão merecida [como o BK me disse: “Chega de ver preto sempre se fudendo”]. É necessário valorizar isso. E enaltecer esse “posicionamento” do festival, que serve de exemplo para muitos outros do mesmo porte. Marcelo D2 ressaltou isso. Djonga mostrou na prática ao ser abraçado por geral, que depois fez fila para tirar uma foto com ele. E o Emicida amarrou o assunto lembrando da luta daqueles que deram a vida para que a música da periferia chegasse onde chegou: Dina Di, Sabotage, Chorão. Não é o tal do hype que tanto falam. É conquista. E como toda vitória teve celebração. Não tinha como ser diferente. O RAP quebrou paradigmas. Mas ainda não atingiu a meta. Há muito mais pela frente.
Mas… e as mulheres?
Apesar de tudo, há um ponto a ser considerado. Engrandecemos a organização por colocar a “pretitude” em evidência num festival, como a grande maioria, frequentado por brancos da classe média abastada para cima. Mas também não tem como deixar de falar da escassez de mulheres na lista de artistas. A Pitty foi a ÚNICA [a ÚNICA] entre 16 atrações. Se os pretos foram muito bem representados, isso não aconteceu com o público feminino. Poderia elencar uma quantidade exorbitante de cantoras/rappers que estão fazendo a diferença no cenário artístico nacional e ganhando evidencia lá fora. Só para citar algumas: Liniker, Tássia Reis, Karol Conka, Drik Barbosa.
A intenção não é pressionar para que insiram mulheres por mera obrigação. É uma forma de colocar o tema na roda para que os curadores do João Rock [e muitos outros festivais] se atentem na hora de elencar as atrações. Cada vez mais essa temática vai pesar na balança da decisão de ir [ou não ir] a determinados espaços.
Confira mais algumas fotos do evento: