Se você já teve a oportunidade de ler o livro “As Veias Abertas da América Latina”, do autor Eduardo Galeano (rest in peace!), então já conheceu um pouco do processo de formação da América Latina e de toda a influência norte-americana desde então.
Prova disso é o próprio rap, que pode ser considerado um instrumento de dominação cultural made in USA, mesmo sendo um gênero transgressor. As letras há muito abandonaram o protesto e pregam a ostentação em muitos casos, de certa forma reforçando o valor do capitalismo, sem contar com ufanismo a cada verso.
É bem verdade que muitos países que adotaram o rap utilizam sua forma e conceitos, mas é no discurso que se diferem. Enquanto alguns ainda seguem a popular linha dinheiro-drogas-mulheres, outros ainda buscam falar de problemas sociais, questionando os rumos da sociedade, filosofando sobre a vida ou adotando até um tom mais leve, focado na diversão ou na própria rotina do MC.
A forte influência cultural dos EUA é considerada por muitos um dos fatores que nos afastaram de nossos vizinhos da América Latina, impedindo assim parcerias, comerciais e culturais, e um enriquecimento musical sem tamanho para estilos diversos, incluíndo o rap.
Demorou, mas felizmente as conexões com nossos hermanos MCs têm se fortalecido e gerado frutos. Hoje temos visitas de rappers latinoamericanos fazendo shows no país com mais frequência e artistas vivendo e produzindo no país, como é o caso do colombiano Rubén Dario, o Alomia MC, aqui desde 2012.
Já atuando como MC e produtor em seu país de origem, em projetos como Pretos family, Sangara e Buma, e como muitos, Alomia encontrou no rap uma forma de expressão. “Acho que foi ele (o rap) que me escolheu, me ensinou. Quando eu estava no caminho errado, me resgatou, me brindou a oportunidade de me expressar e canalisar as minhas energias. Por isso, tento ser o mas responsável possível com as minhas letras. Música tem muito poder!”, explica.
Alomia é otimista em relação ao intercâmbio cultural entre artistas da América Latina. “É um processo que está acontecendo aos poucos, agora que a latinoamerica se permite ter suas fronteiras abertas, é uma oportunidade para que os países irmãos comecem a se conhecer um pouco mais e somar as suas culturas”, explica. O rapper passou momentos difíceis quando mostrava seu trabalho no centro de SP e sofreu com a repressão policial graças a Operação Delegada, que teve início em dezembro de 2010 em convênio entre a prefeitura de São Paúlo, à época comandada por Gilberto Kassab, e o governo de São Paulo, de Geraldo Alckmin.
Na operação, artistas de rua eram enquadrados da mesma forma que os ambulantes, estando sujeitos à prisão e truculência policial. “É uma realidade triste em que o artista de rua vê o seus direitos pisoteados, material e autoralmente roubado. O tipo de abordagem que fazem é absurdo, no qual, na maioria das vezes acaba em violência por parte dos organismos reguladores. Eu já tive os meus CDs levados, pisados e jogados no lixo. Por outro lado, sou consciente de que este tipo de atitude de alguns não representa o que verdadeiramente é o Brasil. Eu acredito que os bons estão em maior número”, reflete.
Fã de Sabotagem, Gilberto Gil, Seu Jorge e Zeca Balero, Alomia lançou neste mês o clipe da música “Pa Mi Gente”. Gravado na Baixada Santista, o clipe é dirigido por Gael Motae presta homenagem aos trabalhadores pobres, latinoamericanos, migrantes e principalmente ao povo negro. A fotografia do vídeo fica por conta de Lilo Munhoz e Sérgio Júnior, também responsável pela montagem, produção de Laís Araújo e Arquimedes Machado e making of de Mariana Pires. Otimista, o rapper não desanima da caminhada e mira no futuro. “Continuar na luta, porque como disse Sabotagem, o rap é compromisso!”.
*foto por Lilo Munhoz
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