Após fase de isolamento, o MC retorna com um disco de 13 faixas que vai do samba ao trap e traz reflexão e provocações
– por Eduardo Ribas (@duardo)
Desde seu último lançamento, a mixtape Aumenta o Volume, de 2013, Slim Rimografia esteve distante dos holofotes. Mas em 2014, Slim surpreendeu ao participar do reality show global Big Brother Brasil, terminando a disputa em 5º lugar. Após o programa, Slim teve dificuldades com o reflexo da exposição e por ser reconhecido nas ruas apenas pela aparição na TV aberta. Isso fez com que ele se recolhesse até voltar a se sentir a vontade para dar as caras.
Esse período serviu também para que o MC focasse em sua vida e tivesse mais contato com o desafio de viver de arte. Entre a atenção dividida com a filha de oito anos, o pai cadeirante e as demais correrias do dia a dia, Slim criou M.Arte, com um título que brinca com o isolamento do artista ao se remeter ao planeta vermelho, que primeiramente seria um EP e que acabou se materializando como um álbum de 13 faixas.
Lançado quase que de surpresa na última sexta-feira, dia 18, M.Arte marca a volta de Slim Rimografia com um disco sensível, introspectivo, mas que também traz relances de humor do Slim Rimografia de Financeiramente Pobre (2003), musicalmente mais orgânico, que vai do samba ao trap e que traz participações de nomes como Rincon Sapiência, Rashid e Xis.
Aproveitamos para trocar uma ideia com Slim, que em breve irá lançar dois novos videoclipes e voltar aos palcos para promover seu trabalho.
Aperte o play e ouça M.Arte enquanto lê a entrevista.
Per Raps: De onde veio a ideia de criar M.Arte?
Slim Rimografia: Na verdade, quando comecei esse projeto eu tinha vários nomes, várias ideias na cabeça e M. Arte foi uma das coisas mais recentes. E o Marte é porque eu acho que esse espaço, esse tempo que eu fiquei longe, muita gente falava da distância de onde eu moro, as casas de tijolinho, no bloco mesmo, então cê tem aquele vermelhão. E eu acho que o disco tem uma coisa assim de ar, muito instrumento de ar, muita coisa que remete a isso. E também por ser M.Arte, minha arte, o meu jeito de fazer. Então foi uma junção de palavras, na real, que eu acredito que tenha tudo a ver. Você vê muita gente especulando o futuro, se a gente vai mudar pra esse lugar (o planeta Marte), se a gente vai chegar. As pessoas olhando pra periferia também, será que existe vida de verdade lá, será se existe pessoas felizes de verdade lá? Então acho que tem tudo a ver com M.Arte.
Per Raps: Fomos tomados de surpresa pelo lançamento do disco. A ideia era causar esse efeito?
Slim Rimografia: Na real foi um disco meio surprise. Eu fiquei produzindo várias músicas e dessas músicas eu escolhi 7 que seriam um EP, depois resolvi escolher mais umas e acabou virando um disco. E aí o restante das outras músicas eu pretendo lançar num futuro breve. Mas foi uma coisa meio espontânea mesmo. Eu tô sempre fazendo músicas e as pessoas ficavam ouvindo e falando “e aí mano, cê num vai soltar?”, aí de uns 2 meses pra cá eu comecei a organizar tudo pra soltar, pensando numa data. Mas acho que foi legal essa surpresa também.
Per Raps: Esse disco mostra um Slim diferente, mais maduro e experimental talvez. Você consegue fazer essa leitura também?
Slim Rimografia: Sobre as diferenças é uma coisa engraçada porque acho que todos os meus discos são um diferente do outro, acho que nenhum é igual. E às vezes algumas pessoas pedem “pô, você podia fazer um disco igual o primeiro”. Pô, mas igual o primeiro eu já fiz! Acho que não tenho o negócio monogâmico, artisticamente sabe. Então a cada momento eu tô fazendo uma parada diferente. Eu tenho outro EP que tem uma característica totalmente diferente desse também, então eu acho que eu gosto muito desse lado de experimentar, musicalmente falando.
Eu vou adquirindo equipamentos novos, novos plugins e vou fazendo. Esse disco tem poucos samples, a maioria eu toquei mesmo, então ele acabou me levando a uma outra atmosfera instrumental e essa atmosfera me levava à um outro lance de musicalidade, de rima também. Então tem uns refrões cantados, tem umas coisas em outro timing que acho que as pessoas nunca tinham me escutado fazer assim.
Não sei se é um amadurecimento, mas acho que uma constante mudança. Acho que não podemos prender o artista a pintar só de uma cor, tipo “nossa, você só pode usar o amarelo”. Você pode usar o vermelho, o roxo, você pode usar só uma cor. E acho que o Slim tem muito disso, cada disco vai ser um disco. Goste ou não, cada disco vai ser uma vibe completamente diferente.
Junto com o disco, surgiu também “Expedição a M.Arte”, vídeo criado em parceria com a Art in Click, que sintetiza o espírito do álbum e mostra um pouco da rotina do MC e seus sacrifícios diários. Assista:
Per Raps: O que o Slim estava passando no momento da criação de M.Arte: estava feliz ou triste, estava com as contas em dia ou não, estava se sentindo inspirado ou forçou a mão para escrever, estava lendo que livros, estava achando o quê do mundo no momento?
Slim Rimografia: O que eu tava passando, na verdade, acho que todos os momentos. Esse vídeo, “Expedição a M.Arte”, eu bolei ele depois que o EP estava pronto e consegui uns parceiros que fizeram um trabalho maravilhoso, o Pietro e o Renato, da Art in Click, que conseguiu sintetizar bastante.
Acho que o Slim era todos aqueles momentos e o disco tem isso, umas músicas que falam um pouco do lado da solidão, música que celebra mais o lance da vida, aí tem uma música que é mais do MC, do cara de batalha, tem outra que é outra pegada totalmente diferente. Então eu acho que tava vivendo todos os sentimentos. Não tem como a gente viver só um momento. A gente não tem como ficar feliz o tempo todo, acho que essa parada até cansaria.
Pesquisei muita coisa espiritual, eu tenho uns lances dessa busca e acho que o momento era esse mesmo. Na verdade, eu fiquei fazendo uma releitura do meu trabalho, de mim mesmo, tentando entender pra poder sintetizar na minha música. E o disco é isso, tem todos esses momentos: começa mais agitado, numa faixa que lembra mais o Slim tirando onda do primeiro disco, depois a faixa “Fuma Mais Um”, que é uma parada mais isolada. Então é uma coisa muito diferente e o legal que as pessoas piram numa vibe de som e outra pira numa outra totalmente diferente porque a gente vive vários momentos. Acho que as pessoas vão ter essa mesma sensação.
Per Raps: Que artistas, discos e músicas estava ouvindo no momento, consegue lembrar?
Slim Rimografia: Sobre os discos e as músicas, eu fico sempre ouvindo muita coisa. Eu já tive uma resistência pelo trap, o lance do boombap, mas quando eu comecei a mudar minha base de produção, comecei a entender como a tecnologia influenciou o jeito de fazer música. Então eu ouvia de tudo, desde Kendrick (Lamar) a Lil Uzi, e eu acho que isso soa um pouco.
Per Raps: Como rolaram as participações do disco, principalmente a de Xis, Rashid e Rincón Sapiência?
Slim Rimografia: Eu sempre pensei numas participações que eu vejo a pessoa muita na música, sabe? Você ouve aquela música e pensa “aqui cabia fulano”. Aí a do Rincon (Sapiência), eu tinha feito a “Maloqueiro Chique” e fiquei pensando. Escrevi só uma parte e pensei que não ia escrever outra parte e precisava de alguém. Pensei nele pelo histórico, pelo som dele. Convidei, ele topou, colou aqui no estúdio, escreveu, gravamos e rolou.
Rashid foi a mesma coisa. A gente tinha se encontrado no aeroporto, fiz uma versão de um som e pensei nele. Ele achou da hora porque já conhecia o beat e aí fez. E o Xis eu já tinha a música, na real, aí fui num show do Rincon. O Xis tava rimando, e eu sou fã do Xis, aí fiquei ouvindo lá e falei “pô, acho da hora você rimar do jeito que você rima, me influenciou bastante”. Falei pra ele que tinha um som, “‘Que será’, cê topa?”. Ele falou “manda lá pra eu ouvir”, chapou nos beat e uns dias depois ele já tinha mandado os versos.
Per Raps: Qual é a mensagem do M.Arte?
Slim Rimografia: A mensagem do M.Arte? Eu acho que o teaser é a maior mensagem. Como é difícil se fazer e viver de arte. Às vezes a gente acha que é fácil porque vê alguém bem sucedido e fala “caralho, o cara estourou, tá com grana, show, a roupa que ele quer, mulheres, drogas, bebida e tal”, mas a gente sabe que é muito difícil viver de arte. A gente vê muita gente talentosa que tá passando dificuldades com sua arte. E muitas vezes o que acontece é isso. Eu sou um cara que tem dois filhos, minha filha mais velha mora comigo, vai fazer um ano agora, então eu tive que me adaptar pra fazer meu disco, cuidar da minha filha, levar na escola, voltar, fazer um rango, cuidar das coisas dela, dar uma atenção pra ela. Tenho meus pais, o meu pai é cadeirante, aí ajudo minha mãe com a situação do meu pai e ao mesmo tempo eu tenho que fazer as coisas que eu gosto. Tipo, cuidar de mim, cuidar do corpo, da alma, entendeu?
E a mensagem do M.Arte é isso, amor a arte, a luta para se fazer arte. Então eu acho que uma boa parte dos artistas também vive esse lado, não só o glamour, mas existe esse lado também que muitas vezes não é exposto. Às vezes a pessoa vive tudo isso, mas mostra que a vida tá tranquila. E na verdade não, eu quis mostrar do jeito que é, queria que as pessoas entendessem um pouco desse lado.
Per Raps: Alguma mensagem final?
Slim Rimografia: A mensagem final é: ouçam, acreditem, apoiem verdadeiramente a arte que vocês curtem. Por que às vezes a gente se mobiliza muito na parada negativa e a gente não impulsiona muito as paradas que a gente gosta. E queria agradecer quem tá se mobilizando, quem tá feliz que eu tô lançando disco, que estão curtindo as músicas, isso é muito legal. Sou muito grato por esse carinho. Mesmo com esse hiato, as pessoas se mobilizam e tão curtindo o trampo. Tâmo de volta!