O rapper carioca Black Alien enfrenta um ciclo de 10 anos de altos e baixos antes de retornar com seu aguardado novo álbum, a sequência de Babylon By Gus

A história da música mundial está repleta de mitos e lendas, no rap não poderia ser diferente. Assim como as lendas vivas, histórias de lançamentos de álbuns permeiam a carreira de artistas que anunciaram um novo disco que, infelizmente, não veio a se tornar realidade. Pena para os fãs, mais ainda para a música como um todo. No entanto, e felizmente, não foi o que ocorreu com o aguardado Babylon By Gus Volume 2 – No Princípio Era o Verbo. O segundo disco do rapper carioca Gustavo Ribeiro aka Black Alien teve duros obstáculos pela frente, entre eles, um álbum antecessor que, mesmo não tendo sido um sucesso de vendas, é considerado por muitos um clássico de seu gênero – e por que não de toda música brasileira? -, assim como uma dependência química e tentativas frustradas de voltar aos palcos.

Lançado em 2000, o ábum Babylon By Gus Volume I – O ano do Macaco era transgressor, tinha produção afinadíssima de Alexandre Basa e mostrava Black Alien em sua melhor forma, após lançamentos dispersos junto de seu finado parceiro Speedfreaks* (descanse em paz!) e de sua participação no grupo Planet Hemp, de 1996 a 2001. No entanto, a épica estreia foi também a cruz que o genial Black Alien carregou em sua carreira, e a cobrança não foi pouca. Assim como seu conterrâneo Marechal, cujo disco nunca de fato se materializou e ainda é aguardado por seus fãs, a ideia de um lançamento foi se tornando tão distante que por pouco não assumiu o status de lenda.

(*A perda de seu amigo e primeiro incentivador no rap, Speedfreaks, foi um fato muito marcante na vida de Black Alien. Assassinado em março de 2010, o também rapper de Niterói Cláudio Márcio de Souza Santos morreu sob duas suspeitas e pouca investigação: dívidas de drogas, segundo a polícia, e a confusão de traficantes, que acharam que o rapper era da polícia, segundo um parceiro de palco. “Eu era comissário de bordo, larguei meu emprego, há 17 anos, para viver da música por causa dele [o Speed]. Eu estava aprendendo música com ele, que sempre me ensinou”, desabafou Black Alien no funeral do amigo.)

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*Foto: Paulo Peixoto

Foi necessário muita força de vontade, conversas com amigos, apoio dos fãs e das pessoas próximas, e um crowdfunding realizado em 2013 na plataforma Catarse, que primeiro bateu na trave, mas que conseguiu ultrapassar o valor requisitado para a produção do volume 2 de BBG após baixar os custos e, finalmente, o que era apenas um desejo, uma ideia, se materializou em forma de rimas. E entre verbos e adjetivos, o nascimento de uma nova obra resultou na libertação de Black Alien. “A gente está criando, com a humildade de olhar para trás, a curiosidade de olhar para a frente e a coragem de se olhar no espelho para ver que artistas somos hoje”, pontuou o rapper na página da arrecadação para o disco no Catarse, enquanto gravava o disco.

A importância da obra é tanta – seja para o público, o rap e, principalmente para o próprio Black Alien -, que seu conteúdo fica quase que em segundo plano. É a simbologia de seu lançamento que marca. A expectativa, torcida e ajuda via crowdfunding dos muitos fãs, o resgate, e a superação pessoal do artista, além do incentivo e companhia dos amigos nos bastidores, que se mostraram fatores de uma equação cujo resultado tornou possível o que mais importa. Finalmente, Babylon By Gus Volume 2 – No Princípio Era o Verbo está na praça.

O período longe dos palcos e dos estúdios

“Eu era Nova Orleans e por aqui passou o Katrina”

Antes de lançar seu primeiro disco, era fácil encontrar uma nova joint do Mr. Niterói pela web , quase sempre com Speedfreaks ao lado, trazendo suas metáforas avant-garde, seu flow metamorfo e vocabulário prolixo, misturando temas complexos e palavras em português e inglês com a facilidade de uma conta básica de matemática. Uma das melhores descrições do rapper vem do blog carioca Urbe: “…ouvir Black Alien é fazer uma viagem para dentro da cabeça do Gustavo. Um lugar inquieto, com mil pensamentos passando e se cruzando a todo tempo. Gustavo absorve e armazena referências de todas as partes. Quem já esteve com Gustavo sabe bem disso. Ele fala rimando mesmo quando conversa, uma eletricidade que não para e não tem hora pra fluir”.  No entanto, eis que veio o tortuoso hiato. “Eu era Nova Orleans e por aqui passou o Katrina”, filosofou Black Alien sobre seu sombrio período.

Hoje, aos 42 anos, Gustavo Black Alien está mais maduro e isso é facilmente percebido em seu discurso. Em uma série de seis vídeos lançada este ano e que serviu como teaser para o lançamento do novo disco, intitulada “No Princípio Era o Verbo” (assista no vídeo acima), o MC fala de temas diversos e, entre eles, sobre o difícil momento de se livrar da dependência química, que chegou três internações e um quadro de depressão, além do resultado de escrever sóbrio.

O caminho foi conturbado, e nele fizeram parte shows desconexos, uma apresentação em BH em que Black Alien simplesmente não apareceu e, entre um problema e outro, um show que ficou marcado pela emoção, o de 10 anos de Babylon By Gus Volume I – O ano do Macaco, realizado no Cine Joia, em São Paulo, ao lado de Rael, BNegão,

seu parceiro de longa data, e Jorge Du Peixe, do Nação Zumbi.

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Sobre o disco

“Estou fazendo um disco novo com muito carinho e cuidado. Apesar de ser um trabalho bem solar, ele ainda conta com alguns temas pesados. A grande diferença deste para o primeiro são as participações em vocais e letras.”, contou Gustavo Ribeiro em entrevista à Rolling Stone Brasil, em setembro de 2014. Mixado e produzido por Alexandre ­Basa (mesmo parceiro do Volume 1) no estúdio Red Bull Studio São Paulo, masterizado por Buguinha (Dub) no Studio Mundo Novo e com design e capa do Petit Pois Stúdio, de Felipe Motta (aka Cavalo Banguela), o disco traz participações de Edi Rock, Parteum e Kamau, Luiz Melodia, a cantora Céu, Lino Krizz nos backing vocals e scratches de DJ Castro e Nutz, entre outros. Com mais de 155 mil visualizações no youtube em quatro dias desde seu lançamento, incluíndo um feriado de 7 de setembro nessa conta, o disco vai bem, obrigado.

Quem ouve a produção encontra de tudo, como é de costume quando se trata de Black Alien. “Eu tento procurar a minha paz aqui dentro, e não fora. Não em droga nenhuma, em matéria, em dinheiro, em ego. Canto isso sem cagar regra, não é conselho de médico. É só um ‘eu já fui por esse e por aquele caminho e me machuquei’, eu preciso falar isso. Falo de política também, porque política tá em tudo, eu dou esse alô. Falo também de amor, do amor que faz a pessoa ouvir o som e ter vontade de amar, de ficar na paz”, conta na página do crowdfunding.

Antes de dar o play no disco, um conselho: ouça Babylon By Gus Volume II –  No Princípio Era o Verbo deixando para trás qualquer sentimento por BBGI. 

Você é o mesmo que era há 10 anos? Pensa e age da mesma forma? Espero que não. E nem Gustavo Black Alien. Suas ideias são outras, suas vivências foram amplificadas, seus temas se misturam de uma nova forma e, quase tudo é diferente. Os obstáculos superados nessa década foram enormes, trazendo uma metamorfose, uma verdadeira troca de pele. “As letras estão menos metafóricas e mais matemáticas”, antecipou Gustavo. Ainda assim, aguarde malabarismos líricos e a criatividade que apenas o Mr. Niterói possui. Agora você está pronto(a)!

MAIS:
Não ouviu ainda o disco? Faça isso no canal de Black Alien no youtube ou baixe no site da oneRPM.

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Assista a série completa ‘No início era o verbo’ aqui.

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